Pedro e Maya tinham essa mania terrível de falar besteira. O tempo todo, desde crianças. Brincaram juntos pela primeira vez na festinha de São João do prédio. Maya soltava estrelinhas, mas uma delas caiu em seu pé. Maya chorou e Pedrinho a abraçou.
Quando Pedro e Maya começaram a namorar no colégio, a mania de falar besteiras ficou pior: só eles entendiam suas próprias bobagens. Os que estavam de fora – o resto do mundo – reviravam os olhos ou ficavam sem graça. Paciência.
Um dia Pedro falou sério e perguntou a Maya se ela gostaria de casar com ele. Ela achou que era brincadeira e riu. Ela tinha o riso mais lindo e Pedro não insistiu. Voltou para casa com o anel que tinha comprado e o guardou. Não falou mais no assunto. Maya era louca e cheia de razão. Achava que amava Pedro com todo o coração, mas ainda era muito cedo para pensar em casamento. Estavam no meio da faculdade e só Deus sabia onde iam parar. Pedro não gostava muito quando ela falava assim. Ela ria.
'Você acha que não dá certo?'. 'Acho que não'. Terminaram. O problema é que uma outra vida vinha chegando. Pedro até pensou em tentar mais, mas Maya se mudou. Doeu e deu raiva, mas Pedro acostumou-se com o clichê que era sua história. Ele terminou o curso e fez algumas coisas. Não soube de Maya por algum tempo, mas depois se adicionaram no facebook. Encontravam-se para tomar café, saíam a noite, faziam maratona de série no fim de semana. Enfim, falavam besteiras e tomavam sorvete.
Pedro e Maya casaram. Foram padrinho e madrinha um do outro. Os casais viajavam juntos e iam ao cinema. Pedro virou pai coruja e começou a ter alguns fios de cabelo branco. Maya era dona de uma editora e trabalhava o tempo todo. Depois de muito tentar, ela não conseguiu engravidar. Pedro a abraçava todas as vezes que ela chorava. O tempo pareceu não se importar muito com Maya e a tristeza passou – ficou só a lembrança do que poderia ter sido e algumas roupas de bebê. Ela e o marido passaram a viajar mais.
O filho de Pedro – já com seus 16 anos - ficou doente. Pedro ficou louco, mas Maya sempre foi cheia de razão. Ela o abraçava todas as vezes que ele chorava e dizia que ia dar tudo certo. Ela trazia comida para a esposa de Pedro, que passava dia e noite no hospital. Quando Maya saía de lá, ela desabava na calçada e chorava de medo. O plano de saúde não cobriu as despesas com hospital e tratamento. Antes mesmo que Pedro pedisse, Maya não hesitou em arcar com as despesas. Pedro agradeceu e, ao longo dos anos, pagou cada centavo dessa dívida que não tinha preço. Maya não queria esse dinheiro, pois sentia que o filho de Pedro era um pouco seu também. Ele não ficou totalmente curado, mas foi vivendo do jeito que deu. Formou-se em engenharia, casou e teve uma filha linda chamada Anita.
Com seus 60 anos, por aí, Pedro e Maya ainda adoravam São João. Sempre faziam festa e reuniam todo mundo. Em uma dessas festas, por algum motivo, Maya perguntou: já pensou se a gente tivesse se casado? / Pedro tentou imaginar os dois velhos, juntos, andando de mãos dadas. A ideia era engraçada. Ele contou a ela que, na faculdade ainda, tinha chegado a comprar um anel de noivado. Ela riu. Os dois fizeram piadinhas. A verdade é que eles ainda tinham essa mania terrível de falar besteira.
Pedro e Maya viveram seus clichês, suas vidas, como todo mundo. Não viraram música de Renato Russo, nem tiveram um final mágico de comédia romântica. Apenas tiveram essa amizade simples e desimpedida de quem vive junto na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, por todos os dias de suas vidas.